STJ valida 30% de honorários em caso de falência

  • 25/04/2024

A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) validou o pagamento de 30% de honorários para um escritório de advocacia que fez a busca e bloqueio no exterior de bens do empresário Daniel Birmann, sócio da empresa Sam Indústrias, falida em 2008. Foi a primeira vez que o STJ julgou o assunto.

O empresário queria reduzir o percentual para 10%, mas a maioria dos ministros não conheceu do recurso, ou seja, não analisou o mérito. Como a falência tem passivo de cerca de R$ 600 milhões (valor ainda em discussão), o escritório ganhará, no mínimo, R$ 180 milhões. Esse valor pode ser ainda maior a depender da quantidade de bens arrecadada.

Segundo fontes ligadas ao caso, as investigações para encontrar os ativos do sócio ocorreram em três países diferentes, inclusive em paraísos fiscais, e já foi bloqueado cerca de R$ 1 bilhão em bens de Birmann. Antes disso, em mais de dez anos de processo judicial, os bens não haviam sido localizados, pois estavam ocultos em empresas offshore e em nome de terceiros no exterior.

O contrato foi feito com o Duarte e Forssell Advogados, escritório especializado em busca de patrimônio desviado, e a massa falida, por sugestão do administrador judicial da época – Carlos Magno, Nery e Medeiros Sociedade de Advogados, em 2018. Em novembro de 2023, o administrador judicial do caso mudou para a Preserva Ação, o mesmo da Americanas.

Na prática, os ministros mantiveram a decisão anterior do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) que validou a contratação do escritório. Além do juiz, o Ministério Público também havia opinado de forma favorável, assim como os credores (REsp 1967252).

O ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, que teve o voto vencedor nesse caso, considerou que, como os honorários não foram questionados anteriormente no processo, não poderiam ser abordados em recurso ao STJ. Mas o ministro também se manifestou um pouco sobre o mérito, ponderando que o juízo da falência, depois de ouvir o Ministério Público, autorizou a contratação dos serviços pela massa falida, representada pelo administrador judicial.

Ainda segundo Cueva, a especificidade do serviço contratado pela massa falida foi considerada pela Corte local ao autorizar a opção da remuneração de êxito. Por isso, os critérios para os honorários do administrador judicial (conforme a Lei nº 11.101, de 2005) não se aplicam ao caso. Por se tratar de honorários advocatícios contratuais, estipulados pelas partes, também não seria necessário seguir os limites do Código de Processo Civil sobre a fixação dos honorários sucumbenciais.

Cueva foi acompanhado pelos ministros Moura Ribeiro e Nancy Andrighi. Não participou o ministro Marco Aurélio Bellizze. Ficou vencido o ministro relator, Humberto Martins, que acatou a tese do empresário para reduzir os honorários para 10% por entender que 30% seria um valor “abusivo”. O julgamento ocorreu no dia 16 de abril.

Daniel Carnio Costa, professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), diz que, além de o STJ não poder reinterpretar contratos privados, não pode fazer reanálise de provas. “Para saber se a remuneração foi muita ou pouca, tem que saber o trabalho que foi feito, e não é permitido reanalisar provas”, afirma Carnio, citando as Súmulas nº 5 e 7 do STJ.

Na visão do advogado, se prevalecesse o voto do relator, ministro Humberto Martins, haveria muita insegurança jurídica no mercado. “Teria uma repercussão muito negativa para o mundo, que iria ter uma visão de que no Brasil não se respeita contrato”, diz.

Angela Cignachi, advogada com atuação em tribunais superiores, afirma que a decisão da 3ª Turma “beneficia o bom andamento dos processos de falência”. “Tínhamos uma falência decretada por mais de dez anos que não tinha um ativo que honrasse o pagamento dos credores. Somente a partir da contratação do escritório que se conseguiu a recuperação de ativos”, diz.

Ela também chama a atenção para a modalidade do contrato, que só possibilita o recebimento dos honorários contratuais sobre o valor recuperado em favor da massa falida. “Se nada fosse encontrado, nada seria devido. O escritório trabalhou no risco e arcou com todos os custos.”

Especialistas afirmam que, apesar de não haver previsão legal sobre a remuneração, a prática do mercado é cobrar 30% nesse tipo de contratação. Em âmbito internacional, pode chegar a 40%. “Se o caso durar muito tempo, acho 30% razoável. Mas se em um ano resolver tudo, 30% é muito, porque escritório no exterior ganha por hora, então quanto mais tempo levar, significa que mais ele gastou”, afirma um administrador judicial.

Nesse caso da Sam Indústrias, acrescenta, “o absurdo é ver que o falido estava recorrendo contra alguém que o estava investigando, o que dá a conotação de que ele não quer ser investigado”.

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