Em 24 de dezembro de 2020, o Presidente do Brasil sancionou a Lei nº 14.112/2020, que altera uma série de disposições da Lei nº 11.101/2005 (Lei Brasileira de Falências) no que toca aos processos de recuperação judicial e falências. A nova legislação entrou em vigor em 23 de janeiro de 2021.
A nova legislação incorpora em grande parte disposições referentes à insolvência transnacional fixadas pela Lei Modelo da UNCITRAL, incluindo o reconhecimento de processos estrangeiros de insolvência no Brasil e a cooperação com autoridades estrangeiras.
Quem pode requerer o reconhecimento no Brasil?
Um representante estrangeiro é parte legítima para requerer ao juízo brasileiro o reconhecimento de um processo estrangeiro de insolvência. Em regra, o requerimento deve ser feito perante o juízo do local com jurisdição sobre o principal estabelecimento do devedor no Brasil.
“Processo estrangeiro” é qualquer processo judicial ou administrativo, de cunho coletivo, inclusive de natureza cautelar, aberto em outro país de acordo com disposições relativas à insolvência nele vigentes, em que os bens e as atividades de um devedor estejam sujeitos a uma autoridade estrangeira, para fins de reorganização ou liquidação.
“Representante estrangeiro” é a pessoa ou órgão, inclusive o nomeado em caráter transitório, que esteja autorizado, no processo estrangeiro, a administrar os bens ou atividades do devedor, ou a atuar como representante do processo estrangeiro.
O requerimento torna o representante estrangeiro ou a massa falida sujeitos à jurisdição das Cortes Brasileiras?
A nova legislação prevê que os pedidos feitos ao juiz brasileiro não sujeitam o representante estrangeiro nem o devedor, seus bens e suas atividades à jurisdição brasileira, exceto no que diz respeito aos estritos limites dos pedidos.
O juiz poderá, a requerimento do representante estrangeiro, autorizá-lo, ou outra pessoa nomeada por aquele, a promover a destinação do ativo do devedor, no todo ou em parte, localizado no Brasil, desde que os interesses dos credores domiciliados ou estabelecidos no Brasil estejam adequadamente protegidos.
As consequências do reconhecimento no Brasil podem variar de caso a caso, e devem ser discutidas minuciosamente com os advogados responsáveis.
Quais são os benefícios de obter o reconhecimento no Brasil?
Com o reconhecimento do processo estrangeiro principal, decorrem automaticamente:
- A suspensão do curso de quaisquer processos de execução ou de quaisquer outras medidas individualmente tomadas por credores relativas ao patrimônio do devedor, respeitadas as demais disposições da Lei;
- A Ineficácia da transferência, de oneração ou de qualquer forma de disposição de bens do ativo não circulante do devedor realizadas sem prévia autorização judicial;
- A suspensão do curso da prescrição de quaisquer execuções judiciais contra o devedor, respeitadas as demais disposições da Lei.
Além disso, quando necessário para proteger os bens do devedor e no interesse dos credores, o juiz brasileiro poderá determinar, a pedido do Representante Estrangeiro, entre outras, as seguintes medidas:
- A ineficácia de transferência, de oneração ou de qualquer forma de disposição de bens do ativo não circulante do devedor realizadas sem prévia autorização judicial;
- A oitiva de testemunhas, a colheita de provas ou o fornecimento de informações relativas a bens, a direitos, a obrigações, à responsabilidade e à atividade do devedor;
- A autorização do representante estrangeiro ou de outra pessoa para administrar e/ou realizar o ativo do devedor, no todo ou em parte, localizado no Brasil;
- A concessão de quaisquer outras medidas que venham a ser necessárias.
O reconhecimento permite que o Representante Estrangeiro requeira a declaração de ineficácia de transações fraudulentas, na medida em que poderão ser ajuizadas as medidas legais dispostas nos artigos 129 e 130 da Lei de Falências Brasileira.
Cooperação entre Tribunais
Mediante o reconhecimento de um processo estrangeiro, os Tribunais brasileiros deverão cooperar ao máximo com os tribunais estrangeiros ou representantes estrangeiros. O juiz brasileiro poderá comunicar-se diretamente com autoridades estrangeiras ou com representantes estrangeiros, ou deles solicitar informação e assistência, sem a necessidade de expedição de cartas rogatórias, de procedimento de auxílio direto ou de outras formalidades semelhantes.